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Educação brasileira em alta: conversando com professores finalistas do Global Teacher Prize
À esquerda, o professor Alberto Rodrigues dos Santos e, à direita, o professor Helder Guastti
“Eu nunca poderia pensar em educação sem amor. É por isso que me considero um educador: acima de tudo porque sinto amor”. Assim disse o renomado educador brasileiro Paulo Freire. E aqui vamos falar sobre amor. Amor à profissão de educar. O IBGEeduca entrevistou dois finalistas brasileiros do prêmio internacional Global Teacher Prize que celebra iniciativas pedagógicas desenvolvidas por professores do mundo todo.
Alberto Rodrigues dos Santos, professor da rede municipal de ensino de Piraju, cidade do interior de São Paulo, foi finalista em 2023. E em 2025, o concurso teve Helder Guastti entre os melhores. Ele é professor da Escola Municipal de Ensino Fundamental Pedro Nolasco em João Neiva (ES).
Os dois professores passaram por um rigoroso processo seletivo e tiveram seus projetos escolares reconhecidos, tendo sido selecionados entre os 50 melhores do mundo.
Vamos ler o que eles têm a dizer?
IBGEeduca: Nos conte sobre sua trajetória na área de educação:
Alberto: Nasci e cresci na periferia da zona Sul de São Paulo e não tive oportunidade de ter um professor de Artes na escola, mas acabei me formando professor de artes e escolhi ser, para meus alunos, o professor de Artes que eu não pude ter quando criança. Optei por lecionar para crianças de 5 a 10 anos na região mais carente em Piraju, onde moro e trabalho como professor efetivo na rede municipal de ensino da cidade. Conclui o mestrado no Instituto de Arte da Universidade Estadual Paulista (UNESP), onde tive a oportunidade de me aproximar e entender um pouco mais sobre minha prática docente. Minhas aulas são focadas no protagonismo dos alunos e procuro dar voz a eles através de uma escuta atenta e afetiva, acolhendo e procurando criar conexões com o que eles sentem e o que eles querem aprender.
Helder: Venho de uma família de professores, porém, enquanto crescia, não tinha o desejo de seguir na profissão. Conforme me encontrei, num daqueles “atravessamentos da vida”, dentro de uma escola, me apaixonei por completo e, aos poucos, decidi me tornar professor. Busco, diariamente, ser o melhor possível e oportunizar diversas experiências e vivências às minhas crianças, sempre pensando em sua formação integral.
IBGEeduca: Vocês foram indicados para o Global Teacher Prize por quais projetos?
Alberto: O projeto que indiquei como merecedor de apreciação no Global Teacher Prize se chama “Eu sou Sensacional” que propõe uma metodologia de ensino de artes focada no protagonismo estudantil e na construção coletiva do currículo do Ensino Fundamental I da rede municipal de ensino de Piraju. O objetivo é solucionar duas situações problemas: a primeira é sobre o protagonismo dos alunos nas escolhas sobre o que querem aprender e, a segunda aborda o tema “invisibilidade infantil” na sociedade, despertando potencialidades criativas e positivas nos alunos, aumentando a autoestima dos mesmos.
Helder: O Global Teacher Prize destacou da minha trajetória o projeto “Como diz o outro”, que também me rendeu o Prêmio Educador Nota 10 em 2024. O projeto mistura tradição com tecnologia e reconhece a importância de preservar a herança cultural do Brasil na medida em que trabalhamos com contos populares brasileiros.
IBGEeduca: Quais são o impacto e a relevância dos seus projetos na escola?
Alberto: A proposta de ensino e aprendizagem focada no protagonismo e na invisibilidade infantil possibilita uma maior participação dos alunos durante todo o processo de ensino e aprendizagem e na construção do currículo coletivamente. Isto possibilitou trabalhar as potencialidades dos alunos ao máximo, repercutindo na vida dessas crianças e na comunidade escolar, pois ao final de cada ciclo, havia sempre uma exposição ou apresentação dos trabalhos realizados pelos alunos na escola ou em espaços públicos da cidade. Tais ações provocaram a reflexão crítica sobre os temas trabalhados, com propostas de soluções criativas para situações problemas.
Helder Guastti: A meu ver, o projeto “Como diz o outro...” foi de extrema relevância, pois realizou um resgate de tradições populares de cunho oral, além de trazer a contemporaneidade do uso de ferramentas de inteligência artificial na elaboração de ilustrações; uma verdadeira união intergeracional entre o que era de conhecimento dos familiares e este universo tecnológico que é tão próximo da realidade das crianças.
IBGEeduca: Como foi a reação das suas escolas, considerando alunos, direção e comunidade escolar quando vocês foram indicados ao prêmio?
Alberto: A reação dos alunos foi incrível porque eles também fazem parte desta conquista. Afinal, são por e com eles que conseguimos chegar até aqui. Sem eles nada teria sentindo. A reação mais verdadeira e pura foi das crianças da escola que torceram e se sentiram parte de tudo isso.
Helder: Venho de uma cidade bem pequena no interior do Espírito Santo, então há certo “estranhamento” com as dimensões que meu trabalho tem alcançado, mas posso dizer que, especialmente entre as crianças, há um senso de comoção muito bonito de vivenciar.
IBGEeduca: A vida de vocês mudou depois que souberam estar entre os 50 melhores professores do mundo?
Alberto: Após a premiação do Global Teacher Prize, o respeito e admiração que a população da cidade tem pelo meu trabalho aumentou e posso contar com o apoio da comunidade, dos pais e familiares para implementar os projetos na escola. Além de atrair a atenção da administração pública para o trabalho desenvolvido na unidade escolar.
Helder: Me sinto mais que vitorioso, por poder evidenciar o trabalho das crianças, pôr em foco o que desenvolvemos no Espaço de Leitura (que era meu sonho de menino) e por poder mostrar que sim, é possível “chegar lá” com comprometimento, dedicação, estudo e empenho. Queria mostrar a mim mesmo que conseguiria e às crianças que elas podem TUDO.
IBGEeduca: Quais seus planos para o futuro?
Alberto: Os planos para o futuro é continuar nossos projetos, agora com a criação e implementação do projeto “Arte Sustentável: construindo sonhos e preservando o futuro” que é sobre a fabricação de tijolos ecológicos feitos com plástico reciclado, realizado com crianças da Escola Municipal Prof. Gilberto Bonafé, também em Piraju. Este projeto integra arte e educação ambiental, propondo soluções sustentáveis a partir da fabricação de tijolinhos feitos com plástico retirado do meio ambiente. A importância de se trabalhar no ambiente escolar questões relacionadas com as mudanças climáticas é outro ponto importante e que deve ser destacado, porque ao darmos enfoque em assuntos que propõe mudanças significativas de pensamento e ação, estamos cuidando do futuro do planeta. São essas crianças e jovens os futuros líderes do mundo que poderão transformar a sociedade, criando soluções sustentáveis para as formas de produção e consumo.
Helder: Continuar lutando por uma “Educação Libertadora e Afetiva”.
IBGEeduca: Quais dificuldades vocês precisaram superar para tornarem seus projetos uma realidade?
Alberto: Precisei superar muitas dificuldades para realizar este projeto, mas a maior foi quebrar os paradigmas criados durantes todos esses anos sobre o ensino de Artes nas escolas. Especialmente, com relação aà construção do currículo escolar que parte sempre do olhar dos adultos, sem levar em consideração os anseios e curiosidades dos alunos. Além disso, a falta de material e espaços adequados para a realização do projeto também foi um agravante.
Helder: As maiores dificuldades, na minha realidade de escola pública, vão de encontro a questões de recursos, principalmente. Mas também do “engessamento” da rede municipal que tenta, a todo momento, colocar os docentes em pequenas caixas, tentando limitar a autonomia pedagógica.
IBGEeduca: Vocês continuam aplicando os projetos vencedor nas suas escolas?
Alberto: Continuo meu trabalho nas escolas onde leciono propondo minha metodologia de ensino de Artes baseada nas estações do ano, aprimorando e inserindo novas ferramentas, sempre com o olhar atendo às pequenas coisas.Acredito que é na observação do micro que entendemos o lugar que ocupamos e que, a partir desse lugar, podemos ampliar nosso olhar para as coisas do mundo, somando experiências de vida, olhares diferentes, para assim, nessa soma de ideias e criações coletivas, transformar o macro para um bem comum.
Helder: Não. Hoje ele se encontra em outros desdobramentos.
IBGEeduca: O que significa ser professor para vocês em uma frase?
Alberto: Ser professor é acreditar na transformação do mundo pela educação, especialmente, em uma educação que priorize a diversidade de pensamentos, a cidadania global, a inclusão, a equidade e o despertar de potencialidades positivas das crianças e jovens para a construção de um mundo melhor.
Helder: Ser professor, para mim, é poder contribuir, de fato, para a efetivação de mudanças e transformações positivas no mundo, enquanto me transformo neste processo...
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